domingo, 17 de fevereiro de 2013

Casas de repouso

Hoje tomei coragem para escrever sobre algo que ainda me emociona muito, mas que é necessário.

Sobre casas de repouso ou clínicas para idosos.

Não sou uma especialista no assunto, mas posso dizer como tem sido minha experiência com isso. E talvez quem sabe, posso ajudar alguém que esteja precisando de conselhos.

Meu pai foi diagnosticado com Parkison já faz algum tempo. Ele conviveu com essa doença por muitos anos e conforme o tempo ia passando, apesar das dificuldades, ele vivia uma vida normal e saudável. Só que ele nunca foi de tomar remédios nos horários corretos, apesar de sempre ir na casa dele, deixar tudo separadinho com cores, números e brigar muito para que ele tomasse. Enfim... com o passar do tempo a doença foi piorando e junto com elas, foram surgindo outras coisas...

Até que no final de 2011 meu pai ficou bem debilitado por conta de uma infecção urinária que piorou o quadro do Parkison, além do diagnóstico de demência senil. Esse quadro deixou ele totalmente dependente. Tentamos cuidar dele em casa contratando cuidadoras para ajudarem, dando alimentação especial e adaptando a casa inteira para ele. Desde cama hospitalar, até cadeira pro banho e etc...

Só que depois de algum tempo, percebemos que era muito difícil manter essa rotina em casa. Além de administrar todas as pessoas que entram e saem, era preciso administrar tudo aquilo que precisa ser pago, comprado, alugado...Uma única cuidadora não conseguia sozinha dar banho nele, então sempre eu e minha mãe precisávamos ajudar. Além de preparar a comida especial, limpar tudo que ficasse sujo para evitar infecções... e apesar de nosso esforços, para meu pai não estava confortável.  Fora outras situações que deixavam a questão ainda mais difícil.

Então, sai em busca de uma clinica de repouso.

Tomar essa decisão não é fácil. Afinal de contas, é meu pai que está ali. Claro que eu quero ele por perto, quero cuidar dele e dar o que for melhor. Porém, naquele momento, ele viver na minha casa não era o melhor que eu poderia dar. A gente não dormia direito, não comia direito e não sorria com sinceridade mais. É muito difícil. Ainda mais que ele tinha momentos de lucidez e não entendia a doença dele.

Procurei clínicas próximas da minha casa. A maioria achava pela internet e ia pessoalmente visitar. Sério, visitei umas 7~8 clinicas da região até encontrar uma que eu sentisse confiança em deixar que cuidassem do meu papai. Acabei escolhendo a Casa Pró-Idoso. E inclusive indico para qualquer pessoa que esteja passando por essa situação.

A clinica é bem limpa e as enfermeiras atenciosas. Alias, funciona mais como clinica do que como uma casa de repouso. O médico passa todos os dias e acompanha o quadro evolutivo dos pacientes. Tem sempre alguma enfermeira no andar e não tem necessidade de ter uma cuidadora especial pro idoso. Como meu pai estava bem debilitado, ele precisava de mais atenção e senti que ali ele teria.

E bom... uma vez que escolhi a casa, tínhamos que fazer a mudança. Na época, apesar das doenças, meu pai era lúcido. E como é que você explica pro seu pai que ele vai se mudar da sua casa (que é a casa dele também) para uma clinica de idosos? Eu morri por dentro naquele dia. E nesse momento que escrevo me emociono ao lembrar.

Foi feito com muita coragem e muito amor mesmo. Porque só amor para suportar essas coisas. Uma ambulância buscou meu pai, que foi perguntando para onde ia e o porque. No começo não falamos exatamente o que era, mas dissemos que ele iria para a clinica para ter melhores cuidados e que voltaria para casa assim que estivesse melhor. E sinceramente, se ele melhorasse era isso que aconteceria mesmo. Mas todo mundo já sabia que não há melhoras nesse quadro.

E é uma merda viver assim. É uma merda saber que meu pai só vai piorar, porque é uma doença degenerativa. É uma merda mesmo. Meu pai era um cara que corria sempre no parque e sempre gostou de ficar perto da natureza. Enfim. Essas razões a gente nunca entende né?

Bom... uma vez ele lá, começou uma dor diferente...
Dói visitá-lo. Porque dói ver que ele está naquela situação. E dói mais ainda não poder levar ele pra casa, mesmo ele pedindo para ir embora. Dói não poder dizer as verdades da vida pra ele. E morro um pouco todas as vezes que tenho que ir embora e deixo ele lá. Só que eu sei que ele está melhor ali. Eu sei.

Na clínica ele vê pessoas diferentes o tempo todo. Ele tem o quarto dele, mas ele vê outras pessoas. As enfermeiras, os médicos e os outros idosos. Ele tem espaço para caminhar e tudo ali já é adaptado ao idoso, então ele fica mais seguro. Conforme o tempo foi passado, eu entendi melhor como funciona a mente dele.

Tipo, ele não sabia mais o que era a casa dele. Ele não se lembrava mais do apartamento que morou sozinho antes de ficar doente, mas ele lembra da minha casa, quando ele ainda era casado com minha mãe. Ele lembra da antiga loja que tinha e as lembranças são mesmo misturadas. Então, quando ele dizia que queria ir para casa, na verdade ele não conseguia lembrar direito que casa era essa. E tiveram vezes que sai com ele para levá-lo em consultas ou ainda para passear, que ele mencionava a clinica de repouso como casa.

É assustador ser responsável por alguém assim. Era meu pai que cuidava de mim e hoje sou eu quem cuido dele. E as vezes eu não fazia ideia se estava tomando a decisão correta. Porém, um dia meu pai me disse que ficava seguro quando eu estava ao lado dele, dizendo o que fazer e cuidando dele. E isso é lindo.

Agora... as pessoas que trabalham naquela casa de repouso... elas são lindas.
Elas são mais do que funcionárias, elas são humanas. Elas compreendem as queixas dos idosos, fazem piada durante o banho ou troca de fralda pra deixar o ambiente mais leve e elas dão apoio a nós, familiares que as vezes, ficamos tão perdidos em nossos medos que não sabemos ver aquilo que acontece.

E vou dizer com toda sinceridade da minha alma. É fácil entender os familiares que somem da vida dos idosos. É tão dolorido tudo isso, que é muito fácil simplesmente pagar a clinica e nunca visitar o idoso. Fugir do problema mesmo. É preciso ter muita coragem pra continuar nessa luta e nem todos tem. Da família dele, só eu e minha mãe vamos visitá-lo. E as vezes, é muito difícil pra mim.

Nunca abandonei e jamais abandonaria, mas as vezes fico dias sem ir. E quanto mais tempo passa que a gente não vai, mais medo dá. Antes o medo era dele brigar comigo, pedir pra ir embora e eu não saber como explicar as coisas. Ou que ele não entenda. Hoje, ele tá tão tão doente que o medo mesmo é ver ele assim, doente.

Eu faço terapia duas vezes por semana e isso que me dá forças para continuar fazendo a coisa certa. Só que não é fácil. Só que também não é assim tão difícil. Apesar de triste, já tivemos momentos felizes ali dentro. Uma vez eu visitei meu pai durante uma sessão de fisioterapia dele e ele ficou tão feliz que a fisioterapeuta dele disse que foi um dos melhores dias dele. Ele gostava de dividir as conquistas dele comigo.

E sabe... todos os problemas somem quando meu pai sorri pra mim.
Hoje infelizmente ele já não consegue falar e precisa comer com ajuda de sonda, mas... ele ainda sorri quando me vê e ele escuta as coisas que eu falo. E eu procuro estar ali pra ele a cada momento que puder, dando o máximo que eu posso nesse momento da vida dele. Mas infelizmente, não podemos mais conversar. Só posso estar ali, segurando a mão dele e cuidando dele.

Eu durmo tranquila, porque sei que ele está muito bem cuidado. Essas clinicas tem algo mágico mesmo, toda vez que entrei lá, sai uma pessoa diferente.



2 comentários:

  1. Ah, Bruna... eu achei o seu depoimento realmente comovente. Eu sinto muito por você estar passando por isso e por seu pai estar nessa situação. Eu te desejo realmente forçar para você continuar enfrentando isso com um sorriso.
    Eu realmente gostaria de te dar um abraço agora!

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